26-04-2019

O primeiro de maio é o Dia do Trabalhador. São José Operário associa-se ao dia, é o seu patrono. É verdade que a pessoa não se realiza sem trabalho, mesmo que este possa ser cansativo e nem sempre o desejado. O trabalho, porém, não pode esquecer a pessoa, tornar-se-ia desumano. Não é um absoluto, é um meio. É a pessoa que dá dignidade ao trabalho. Segundo o Papa Francisco, o trabalho é “a forma mais comum de cooperação que a humanidade gerou na sua história”. É “uma forma de amor civil: não é um amor romântico nem sempre intencional, mas verdadeiro, autêntico, que nos faz viver e levar o mundo para a frente”. Olhando a situação atual, o Papa afirma que há quem tenha de trabalhar e não o devia fazer porque é criança ou está doente, que há trabalhadores que são descartados por doença ou em nome da eficiência, que há quem não lhe seja reconhecido o direito a uma reforma justa, isto é, “nem muito pobre nem muito rica. Pois as “aposentadorias de ouro” são uma ofensa ao trabalho, uma ofensa tão grave como aquelas muito pobres que acentuam as desigualdades do tempo de trabalho”. Além disso, não se inibe de dizer que é “uma sociedade insensata e míope aquela que obriga os idosos a trabalhar por demasiado tempo e força uma geração inteira de jovens a não trabalhar quando deveriam fazê-lo para si mesmos e para todos. Quando os jovens estão fora do mundo do trabalho, às empresas faltam energia, entusiasmo, inovação, alegria de viver, e estes são bens comuns preciosos que tornam melhores a vida económica e a felicidade pública”. E acrescenta: “é urgente um novo pacto social humano, um novo pacto social para o trabalho, que diminua as horas de trabalho de quem está na última fase laboral, a fim de criar trabalho para os jovens que têm o direito-dever de trabalhar. O do trabalho é o primeiro dom dos pais e das mães aos filhos e às filhas, é o primeiro património de uma sociedade. É o primeiro dote com o qual os ajudamos a levantar voo para a vida adulta”.

Quando falamos de trabalhadores e de trabalho, logo associamos os sindicatos. Ao longo dos tempos, os sindicatos foram construindo a sua história e sempre tiveram papel crucial na defesa da justiça social, dos direitos dos trabalhadores, dos reformados, dos desempregados e das mulheres vítimas de desigualdades sociais. Embora as suas lutas não sejam contra ninguém, mas a favor de um bem justo e tendo em conta a real situação económica do país, essa luta nunca foi fácil, mas faz parte de quem constata as situações de injustiça e sonha na possibilidade de um mundo mais justo e mais humano. Assim, a liberdade sindical, a negociação coletiva, o trabalho, o salário digno, a proteção social, o pleno emprego, a segurança, a saúde laboral, os serviços públicos, são direitos que devem ser garantidos sem que haja qualquer espécie de discriminação, o que exige luta, os sindicatos sabem disso. Mas porque o mundo não deixa de mudar, os desafios continuam a ser muitos e a reclamar novos modelos de desenvolvimento ambiental, social e integral. Isto implica que os sindicatos também se cuidem e repensem, tendo sempre como horizonte a centralidade da pessoa, não sejam “correia de transmissão” de interesses partidários nem instrumento de briga para outros fins que não o bem comum de toda a sociedade. O Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, um novo organismo criado pelo Papa Francisco, em tempos reuniu com mais de três centenas de representantes de diversos organismos do movimento sindical internacional. Dessa reunião saiu uma Declaração conjunta onde se confirma a centralidade da pessoa e o direito a um trabalho digno, com normas laborais universais, objetivos e prioridades. Entende-se que o incremento da automação, a individualização, a desigualdade, a ganância das corporações, os baixos salários, a precariedade, o desemprego em massa, a pobreza e exclusão põem em risco a casa comum. Para a Igreja, só a fé concretizada em obras é sinal credível da seriedade com que se vive e celebra a fé. Alicerçada no Evangelho e centrada na pessoa, ela tem na sua Doutrina Social um vasto e rico património que o próprio movimento sindical internacional reconhece como valioso e até pioneiro em muitos aspetos. Defende que os sindicatos são uma estrutura indispensável na vida social e como instrumento de solidariedade. Mas foi sobretudo a partir do início da sociedade industrial, com o Papa Leão XIII, que a doutrina social da Igreja se começou a sistematizar. 

Aos Delegados da Confederação Italiana Sindical dos Trabalhadores, Francisco tornou presente dois grandes desafios que o movimento sindical deve enfrentar e vencer, se quiser continuar credível e eficiente na promoção do bem comum. 

O primeiro é a profecia. A profecia faz parte da própria natureza do sindicato, da sua verdadeira vocação, da sua importância e razão de ser. “O sindicato nasce e renasce todas as vezes que, como os profetas bíblicos, dá voz a quem não a tem, denuncia o pobre “vendido por um par de sandálias” (cf. Amós 2, 6), desmascara os poderosos que espezinham os direitos dos trabalhadores mais débeis, defende a causa do estrangeiro, dos últimos, dos “descartados”. Nas nossas sociedades, porém, “o sindicato corre o risco de perder esta natureza profética e de se tornar demasiado semelhante às instituições e aos poderes que, pelo contrário, deveria criticar. Com o passar do tempo, o sindicato acabou por se assemelhar demais com a política, ou melhor, com os partidos políticos, com a sua linguagem e estilo. E ao contrário, se faltar esta típica e diversa dimensão, até a ação no âmbito das empresas perde força e eficácia. Esta é a profecia, diz o Papa.  

O segundo desafio é a inovação. Se os profetas são as sentinelas que vigiam do seu lugar de observação, também “o sindicato deve patrulhar os muros da cidade do trabalho, como sentinelas que vigiam e protegem quem está dentro da cidade do trabalho, mas que vigiam e protegem também quem está fora dos muros. O sindicato não desempenha a sua função essencial de inovação social se vigiar só os que estão dentro, se proteger só os direitos de quem já trabalha ou está na reforma. Isto deve ser feito, mas é metade do trabalho sindical. A vossa vocação é também proteger quem ainda não tem direitos, os excluídos do trabalho, e até dos direitos e da democracia”. A economia de mercado não aprecia muito o valor do sindicato, esqueceu a natureza social da economia, da empresa. São João Paulo II falava da necessidade da economia social de mercado “que tem como vocação a natureza social da empresa, da vida, dos vínculos e dos pactos”. Talvez que a nossa sociedade “não compreenda o sindicato até porque não o vê lutar o suficiente nos lugares dos “direitos do ainda não”: nas periferias existenciais, no meio dos descartados do trabalho, no meio dos imigrados, dos pobres, dos jovens, das mulheres que são mais fáceis de serem exploradas, dos que estão sob os muros da cidade. E Francisco encoraja-os: “Fazei alguma coisa. Encorajo-vos a continuar e, se possível, a fazer mais. Habitar as periferias pode tornar-se uma estratégia de ação, uma prioridade do sindicato de hoje e de amanhã. Não existe uma boa sociedade sem um bom sindicato, e não existe um sindicato bom que não renasça todos os dias nas periferias, que não transforme as pedras descartadas da economia em pedras angulares”.

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