Um preso de Auschwitz escreveu sobre um dos muitos e terríveis enforcamentos a que assistiu nesse campo de concentração, de horror e extermínio. Enforcamentos solenemente sádicos e horrorosos, cruéis e intimidatórios. Naquele dia enforcaram três: dois adultos e um rapazito. Elie Wiesel escreveu assim: “Os três condenados subiram juntos para as três cadeiras. A cabeça, dos três, foi introduzida ao mesmo tempo dentro dos nós corrediços. “Viva a liberdade”, gritaram os dois adultos. O pequeno, porém, ficou calado. “Onde está Deus? Onde é que Ele está?”, perguntou alguém atrás de mim. A um sinal do chefe do campo, as três cadeiras foram deitadas por terra. Silêncio absoluto em todo o campo. O sol ia-se pondo no horizonte. Em seguida, começou o desfile. Os dois adultos já não estavam vivos. Tinham a língua pendente, inchada, azulada. A terceira corda, porém, continuava a mover-se; como era tão leve, o miúdo continuava vivo…Manteve-se assim durante mais de meia hora, debatendo-se entre a vida e a morte, agonizando lentamente sob o nosso olhar. E nós tínhamos de olhá-lo bem no rosto. Ainda estava vivo, quando passei à sua frente. Tinha a língua vermelha e os olhos ainda não se tinham vidrado. Atrás de mim voltei a ouvir o mesmo homem, que perguntava: “Onde é que Deus está, neste momento?” Então ouvi dentro de mim uma voz que lhe respondia: “Onde está Deus? Ei-lo ali, pendurado naquela forca…”. (in “As sete últimas palavras” de Timothy Radcliffe).

Os que se julgam donos e senhores de tudo e de todos continuam a crucificar e a matar Jesus na cruz: “O que fizerdes aos outros é a mim que o fazeis”, disse-nos Ele. E porquê que isso acontece?

Como recordávamos na Missa da Última Ceia, o Senhor disse a Pedro, relutante em que Cristo lhe lavasse os pés: “Se eu não te lavar os pés, não terás parte comigo”. Dois mil anos depois de Cristo acontece o mesmo. Ainda há quem, na sua importância, tenha preconceitos de autossuficiência e se recuse a que Jesus lhe lave os pés. Isto é, rejeita deixar-se lavar e purificar por Cristo, com a sua graça, com o seu perdão, com a sua misericórdia, com a sua palavra, com o seu testemunho de amor por todos, incluindo os inimigos.

 

RECORDEMOS NA FORMA BREVE:

 

“Naquele tempo, levantaram-se os anciãos do povo, os príncipes dos sacerdotes e os escribas, levaram Jesus a Pilatos e começaram a acusá-lo, dizendo: «Encontrámos este homem a sublevar o nosso povo, a impedir que se pagasse o tributo a César e dizendo ser o Messias-Rei». Pilatos perguntou a Jesus: «Tu és o Rei dos judeus?». Jesus respondeu: «Tu o dizes». Pilatos disse aos príncipes dos sacerdotes e à multidão: «Não encontro nada de culpável neste homem». Mas eles insistiam: «Amotina o povo, ensinando por toda a Judeia, desde a Galileia, onde começou, até aqui». Ao ouvir isto, Pilatos perguntou se o homem era galileu; e, ao saber que era da jurisdição de Herodes, enviou-O a Herodes, que também estava nesses dias em Jerusalém. Ao ver Jesus, Herodes ficou muito satisfeito. Havia bastante tempo que O queria ver, pelo que ouvia dizer d’Ele, e esperava que fizesse algum milagre na sua presença. Fez-Lhe muitas perguntas; mas Ele nada respondeu. Os príncipes dos sacerdotes e os escribas que lá estavam acusavam-no com insistência. Herodes, com os seus oficiais, tratou-O com desprezo e, por troça, mandou-O cobrir com um manto magnífico e remeteu-O a Pilatos. Herodes e Pilatos, que eram inimigos, ficaram amigos nesse dia. Pilatos convocou os príncipes dos sacerdotes, os chefes e o povo, e disse-lhes: «Trouxestes este homem à minha presença como agitador do povo. Interroguei-O diante de vós e não encontrei n’Ele nenhum dos crimes de que O acusais. Herodes também não, uma vez que no-lo mandou de novo. Como vedes, não praticou nada que mereça a morte. Vou, portanto, soltá-lo, depois de O mandar castigar». Pilatos tinha obrigação de lhes soltar um preso por ocasião da festa. E todos se puseram a gritar: «Mata Esse e solta-nos Barrabás». Barrabás tinha sido metido na cadeia por causa de uma insurreição desencadeada na cidade e por assassínio. De novo Pilatos lhes dirigiu a palavra, querendo libertar Jesus. Mas eles gritavam: «Crucifica-O! Crucifica-O!». Pilatos falou-lhes pela terceira vez: «Mas que mal fez este homem? Não encontrei n’Ele nenhum motivo de morte. Por isso vou soltá-lo, depois de O mandar castigar». Mas eles continuavam a gritar, pedindo que fosse crucificado, e os seus clamores aumentavam de violência. Então Pilatos decidiu fazer o que eles pediam: soltou aquele que tinha sido metido na cadeia por insurreição e assassínio, como eles reclamavam, e entregou-lhes Jesus para o que eles queriam.

Quando O conduziam, lançaram mão de um certo Simão de Cirene, que vinha do campo, e puseram-lhe a cruz às costas, para a levar atrás de Jesus. Seguia-O grande multidão de povo e mulheres que batiam no peito e se lamentavam, chorando por Ele. Mas Jesus voltou-Se para elas e disse-lhes: «Filhas de Jerusalém, não choreis por Mim; chorai antes por vós mesmas e pelos vossos filhos. Pois dias virão em que se dirá: ‘Felizes as estéreis, os ventres que não geraram e os peitos que não amamentaram’. Começarão a dizer aos montes: ‘Caí sobre nós’; e às colinas: ‘Cobri-nos’. Porque se tratam assim a madeira verde, que acontecerá à seca?». Levavam ainda dois malfeitores para serem executados com Jesus. Quando chegaram ao lugar chamado Calvário, crucificaram-no a Ele e aos malfeitores, um à direita e outro à esquerda. Jesus dizia: «Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem». Depois deitaram sortes, para repartirem entre si as vestes de Jesus. O povo permanecia ali a observar. Por sua vez, os chefes zombavam e diziam: «Salvou os outros: salve-Se a Si mesmo, se é o Messias de Deus, o Eleito». Também os soldados troçavam d’Ele; aproximando-se para Lhe oferecerem vinagre, diziam: «Se és o Rei dos judeus, salva-Te a Ti mesmo». Por cima d’Ele havia um letreiro: «Este é o Rei dos judeus».

Entretanto, um dos malfeitores que tinham sido crucificados insultava-O, dizendo: «Não és Tu o Messias? Salva-Te a Ti mesmo e a nós também». Mas o outro, tomando a palavra, repreendeu-o: «Não temes a Deus, tu que sofres o mesmo suplício? Quanto a nós, fez-se justiça, pois recebemos o castigo das nossas más ações. Mas Ele nada praticou de condenável». E acrescentou: «Jesus, lembra-Te de mim, quando vieres com a tua realeza». Jesus respondeu-lhe: «Em verdade te digo: Hoje estarás comigo no Paraíso». Era já quase meio-dia, quando as trevas cobriram toda a terra, até às três horas da tarde, porque o sol se tinha eclipsado. O véu do templo rasgou-se ao meio. E Jesus exclamou com voz forte: «Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito». Dito isto, expirou. Vendo o que sucedera, o centurião deu glória a Deus, dizendo: «Realmente este homem era justo». E toda a multidão que tinha assistido àquele espetáculo, ao ver o que se passava, regressava batendo no peito. Todos os conhecidos de Jesus, bem como as mulheres que O acompanhavam desde a Galileia, mantinham-se à distância, observando estas coisas”.

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Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 15-04-2022.

 

 

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