É verdade, caro jovem, não é a vela. Nem foram as cronhas dos soldados do palácio do planalto que arrombaram os ferrolhos daqueles amuos assarapantados pelo revés. Foi o medo e seus grilos. Ninguém gosta de perder nem que seja a feijões, faz prender o burrinho! Nós, porém, perdendo ou ganhando, gostamos de conversar como amigos que mutuamente se desafiam e, às vezes, também se criticam, faz parte. Como sabes, estamos na semana dos Seminários. Não das casas, como é evidente, essas são arcaz de consumições. Falamos da comunidade de pessoas constituída pelos seminaristas, superiores, formadores, colaboradores, famílias dos alunos e pelos fiéis que os têm presente nas suas orações e com os Seminários partilham as suas economias. Todos colaboram para que cada vocação sacerdotal seja “descoberta na sua verdade, amada na sua beleza e vivida com dedicação total e alegria profunda” (PdV37).

 O tema deste ano nasce do conselho que São Paulo dá ao seu amigo Timóteo. Timóteo era jovem de fé sólida, profundamente marcado pelo testemunho da sua avó, Loide, e da sua mãe, Eunice, coisa que muitas famílias cristãs secundarizam, é pena. O conselho de Paulo a Timóteo tem um ‘hoje’ constante, continua atual: “Não te envergonhes de dar testemunho de Cristo” (2 Tim 1,8). De facto, não convém ser cana agitada pelo vento ou mesmo cata-vento. Os ventos que sopram na Igreja, porém, são padrastos, não são brisa agradável, têm origens que nos humilham e massacram. Se não os devemos minimizar, muito menos devemos amuar. É hora de graça, de reparação e purificação. A coerência cristã implica viver solidamente enraizados em Cristo, firmes na convicção e propósito, no amor e na fidelidade, inseridos nas comunidades, não isolados. Os teus amigos, a tua família, os movimentos eclesiais e a tua comunidade paroquial, se te falam de muitos outros caminhos e coisas boas, não devem, seja qual for a razão, inibir-se de te falar e testemunhar como são belos os pés daqueles que anunciam a paz, a boa nova da salvação (cf. Is 52,7). Como sabes, a Igreja, se é divina, está entregue aos homens, é constituída por eles, existe por nossa causa, e somos o que somos. A fragilidade humana é grande, e é tanto maior quanto mais se dispensa a relação com Jesus e se confunde o dever de servir humildemente com o poder e a autoridade, o controlo e a superioridade. Jesus sempre reclamou a coerência de vida, muito mais, por certo, a coerência de vida de quem Ele chama a servir na sua Igreja. O contexto cultural, a crise de fé e da família, e o mais que lhe queiras associar, também dificultam a escuta, o discernimento e o acolhimento de propostas mais contracorrente. No entanto, caro jovem, triste como nós pelo momento que vivemos, não tenhas medo, não vires as costas, “Deus não nos deu um espírito de timidez, mas de fortaleza, amor e sabedoria”. Jesus, apesar de todas as nossas fraquezas, não retira a confiança que depositou na sua Igreja. Se atravessamos tempos invernosos, não é por isso que vamos deixar cair os braços e deixar de falar do que devemos falar e testemunhar o que devemos testemunhar. Antes pelo contrário, confiando nos jovens, o tempo urge que se assuma isso com mais vigor ainda, na esperança de que a primavera volte a florir com mais beleza e qualidade. E tanto mais depressa isso acontecerá quanto mais atendermos à superior iluminação do Espírito Santo. Ele nos ajudará a saber ler os sinais dos tempos, a descobrir as orientações da sociedade que nos envolve, a reconhecer as suas necessidades espirituais, a procurar competências na formação e ação, a discernir quais as prioridades e tarefas a assumir, os métodos pastorais mais aptos para responder às expectativas de uns e outros. E tudo sem minimizar ou adocicar o Evangelho, sem sermos infiéis ao Senhor e à sua Igreja. A Igreja é dom, sempre se renova pela força do Espírito Santo, mas tudo quanto é dom implica arte e tarefa humana. E são sempre os jovens, rapazes e raparigas, quem, ao longo dos tempos, têm assumido o protagonismo na verdadeira renovação e purificação da Igreja. Quando os jovens descobrem o verdadeiro ponto de apoio, eles são capazes de virar a terra de patas para o ar com a alavanca da sua competência e alegria, da sua força e entusiasmo. Esse ponto de apoio é Jesus, o caminho, a verdade e a vida, a pedra angular que não se pode rejeitar. Atentos a Jesus Cristo, que não se cansa de bater à porta de cada um, alguns deixam-se tocar por Ele e abraçam o convite com alegria e determinação. Se Cristo te bater à porta, não olhes para trás, para o mais fácil e cómodo, sê forte na fé e no ideal, procura remar contra a maré em busca do sentido para a vida, passando pelo mundo a fazer o bem, sendo útil, deixando rasto, iluminando o mundo com a tua fé e a tua capacidade de amar. É nas tempestades que se conhece o valor do timoneiro, na certeza de que quem faz andar o barco não são as velas, é o vento que não se vê. A Barca de Pedro na qual navegamos também não será por mera vontade humana que se afundará ou seguirá em frente. É pela força e ação do Espírito Santo que também não se vê. Ele está presente e atua em todos e cada um, desde que cada um e todos, mesmo reconhecendo que têm pés de barro, não contem apenas com as suas forças, mas se abram à ação divina! Tudo podemos naquele que nos conforta! Hoje, como sempre, precisamos de jovens que direcionem bem as suas antenas para escutar e acolher o chamamento de Cristo. De jovens que percebam que a vocação é um dom da graça divina, não um projeto de promoção humana, não um simples projeto pessoal, não um direito, mas um dom recebido em liberdade, um dom que se agradece e aceita com confiança e esperança inabaláveis, uma esperança fundada na incondicional fidelidade de Deus que chama. Há uma enorme necessidade de sacerdotes segundo o coração de Deus, a messe é grande. A experiência diz-nos que quanto mais os leigos se envolvem no apostolado, tanto mais sentem a necessidade de sacerdotes próximos e amigos, bem formados e santos, que os acompanhem e ajudem. E tantos há que, fiéis à palavra dada ao Senhor e à sua Igreja, em plena comunhão eclesial e sem se colocarem em bicos de pés, vivem dedicados de alma e coração ao seu povo, não se deixando nivelar por baixo nem banalizar. Vivem preocupados com o seu dever, com a sua formação permanente e a formação na fé do seu povo, a quem também desejam bem-estar humano e social.
Caro jovem, Jesus Cristo não desiste de chamar os jovens e de os enviar a todas as nações com o mesmo entusiasmo dos cristãos da primeira hora. Se sentires bater à tua porta como quem chama por ti, mesmo que batam levemente, não fiques indiferente, procura perceber quem bate. Parafraseando o poeta, pode ser gente, pode ser chuva, pode ser o vento, pode, mas também pode ser Ele a bater-te à porta para te escutar e falar: “Se hoje ouvirdes a voz do Senhor, não fecheis o vosso coração”. No entanto, seja qual for o teu caminho, rezado e discernido, que a vida te sorria sempre e tu sorrias para a vida.

 Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 04-11-2022.

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