Só para recordar e celebrar. A 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem: "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos" (art.1º). É também o “Dia Nacional dos Direitos Humanos”, instituído pela Assembleia da República (Resolução n.º 69/98, de 22 de dezembro). Trata-se de direitos civis e políticos, como o direito à vida, à liberdade, liberdade de expressão e privacidade; os direitos económicos, sociais e culturais, como o direito à segurança social, saúde e educação, bem como os direitos das nações e dos povos. Democracia com fome é flor ao lado de cadáver, afirmava Pedro Casaldáliga.

Esta tomada de consciência cultural “tem o seu fundamento não só nos acontecimentos da história, mas sobretudo no pensamento europeu, caracterizado por um rico encontro cujas numerosas e distantes fontes provêm da Grécia e de Roma, de substratos celtas, germânicos e eslavos, e do cristianismo que os plasmou profundamente, dando origem precisamente ao conceito de ‘pessoa’, afirmou Francisco, em tempos, na visita que fez ao Parlamento Europeu e ao Conselho da Europa. Pondo o dedo na ferida, lembrou que “persistem ainda muitas situações onde os seres humanos são tratados como objetos, dos quais se pode programar a conceção, a configuração e a utilidade, podendo depois ser jogados fora quando já não servem porque se tornaram frágeis, doentes ou velhos”. Há alguns equívocos “que podem surgir de um errado conceito de direitos humanos e de um abuso paradoxal dos mesmos. De facto, há hoje a tendência para uma reivindicação crescente de direitos individuais – sinto-me tentado a dizer individualistas –, que esconde uma conceção de pessoa humana separada de todo o contexto social e antropológico (…) Ao conceito de direito já não se associa o conceito igualmente essencial e complementar de dever, acabando por afirmar-se os direitos do indivíduo sem ter em conta que cada ser humano está unido a um contexto social, onde os seus direitos e deveres estão ligados aos dos outros e ao bem comum da própria sociedade”. E perguntava ele: “que dignidade existe quando falta a possibilidade de exprimir livremente o pensamento próprio ou professar sem coerção a própria fé religiosa? Que dignidade é possível sem um quadro jurídico claro, que limite o domínio da força e faça prevalecer a lei sobre a tirania do poder? Que dignidade poderá ter um homem ou uma mulher tornados objeto de todo o género de discriminação? Que dignidade poderá encontrar uma pessoa que não tem o alimento ou o mínimo essencial para viver e, pior ainda, que não tem o trabalho que o unge de dignidade? Promover a dignidade da pessoa significa reconhecer que ela possui direitos inalienáveis, de que não pode ser privada por arbítrio de ninguém e, muito menos, para benefício de interesses económicos”. E aos deputados fez um veemente apelo: “Queridos Eurodeputados, chegou a hora de construir juntos a Europa que gira, não em torno da economia, mas da sacralidade da pessoa humana, dos valores inalienáveis; a Europa que abraça com coragem o seu passado e olha com confiança o seu futuro, para viver plenamente e com esperança o seu presente. Chegou o momento de abandonar a ideia de uma Europa temerosa e fechada sobre si mesma para suscitar e promover a Europa protagonista, portadora de ciência, de arte, de música, de valores humanos e também de fé. A Europa que contempla o céu e persegue ideais; a Europa que assiste, defende e tutela o homem; a Europa que caminha na terra segura e firme, precioso ponto de referência para toda a humanidade!”

Os direitos humanos serão tanto mais implementados no seio das sociedades quanto mais se apostar na promoção da fraternidade e da amizade social e maior for o compromisso de todos na defesa e promoção da ecologia integral, como o Papa Francisco tão bem expõe nas exortações apostólicas Fratelli Tutti e Laudato Si. “Muitas vezes constata-se que, de facto, os direitos humanos não são iguais para todos. O respeito destes direitos é condição preliminar para o próprio progresso económico e social de um país. Quando a dignidade do homem é respeitada e os seus direitos são reconhecidos e garantidos, florescem também a criatividade e a audácia, podendo a pessoa humana explanar as suas inúmeras iniciativas a favor do bem comum. Mas, observando com atenção as nossas sociedades contemporâneas, deparamos com numerosas contradições que induzem a perguntar-nos se deveras a igual dignidade de todos os seres humanos, solenemente proclamada há 70 anos, é reconhecida, respeitada, protegida e promovida em todas as circunstâncias. Persistem hoje no mundo inúmeras formas de injustiça, alimentadas por visões antropológicas redutivas e por um modelo económico fundado no lucro, que não hesita em explorar, descartar e até matar o homem. Enquanto uma parte da humanidade vive na opulência, outra parte vê a própria dignidade não reconhecida, desprezada ou espezinhada e os seus direitos fundamentais ignorados ou violados. Que diz isto a respeito da igualdade de direitos fundada na mesma dignidade humana?” (FT22).

Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 09-12-2022.

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