O seu promotor veio donde menos se pensava e como menos se esperava!… Aguardavam alguém que restituísse a independência ao país, o libertasse da potência dominadora contra a qual, submissos e explorados, alimentavam ódios e desprezo. Esperavam um revolucionário que, pela sua estratégia e força das armas, conseguisse tal proeza, esmagando uns, expulsando outros. Pelo seu modo de ser e agir, aquele que se apresentou como tal, segundo eles não podia ser, não tinha perfil para concretizar o que eles desejavam e como eles desejavam. Não era filho de gente importante. Seus pais foram emigrantes ou refugiados políticos. Nascera numa terrinha perdida lá pelos montes por onde os pastores mourejavam, vivera noutra terra da qual nada se poderia esperar. Era pobre, não tinha onde reclinar a cabeça e todos conheciam os seus familiares. No entanto, foi e é o maior revolucionário de todos os tempos. Dividiu a História no antes dele e no depois dele. Se preconceitos humanos não houvesse, mesmo como personagem meramente histórico, interventivo e altamente influente no destino dos povos e da História, deveria ser tema de estudo em todas as escolas, academias e universidades, pois a todos afetou. Promoveu uma civilização fundamentada na cultura do amor e da paz, na dignidade de toda a pessoa. Mas há medo dele, e ele nunca fez mal a ninguém. Manifestava delicadeza e preocupação por todos. Não trazia armas, não fez sangue, não usou de violência, não tinha cadeias, não tinha guarda costas nem mordomias. Apelava à plena liberdade com respeito pelos outros, vinha trazer a paz e a verdadeira alegria de viver. Afirmando ser rei, sossegou os poderosos de então. Esclareceu que o seu reino era doutra categoria. Que os cidadãos desse reino haveriam de ser como crianças, simples e humildes. Que a pessoa vale mais pelo que é do que pelo que tem ou pode. Apelava à mudança da mente e do coração, defendia que era preciso dar a César o que era de César e a Deus o que era de Deus. Que o poder terreno era um poder delegado para servir, para lavar os pés às dores do mundo, não para ser servido e embandeirar em arco. Afirmava que se deveria oferecer o segundo lado da face a quem já lhe tinha esmurrado o primeiro. Chamava a atenção para os pobres e marginalizados. Falava da importância da partilha, do desapego dos bens e das pessoas. Ensinava que era mais fácil um camelo entrar pelo fundo duma agulha do que um rico entrar no reino que anunciava. Recordava os princípios fundamentais do casamento, denunciava a hipocrisia de quem carregava os outros com fardos insuportáveis e eles nem sequer com um dedo lhes tocavam. Apontava a incoerência religiosa e as peneiras dos fingidos e farsantes, que tudo se permitiam e aos outros nada desculpavam. Implicava com quem queria tirar o argueiro dos olhos dos outros e não via a trave que estava nos seus. Tratava os leprosos e as prostitutas com atenção. Não fazia acessão de pessoas, acarinhava as crianças, todos lhe queriam tocar. Com a sua proximidade e pedagogia, gerava empatia, cativava multidões, falava com simplicidade e autoridade. Todos entendiam a sua mensagem. Maravilhados, exclamavam que nunca tinham ouvido alguém falar assim. Reclamava-se Filho de Deus, perdoava os pecados, curava os doentes e ressuscitava os mortos, amava a natureza. Transformou água em vinho, os ventos e as tempestades obedeciam-lhe. Multiplicou o pão e fazia pesca como ninguém, fez-se alimento para o viandante. E vejam a paga dos homens a quem ele sempre ajudou e perdoou: passando pelo mundo fazendo o bem, tornou-se sinal de contradição, foi traído, abandonado, perseguido, preso e torturado. Sem nunca os ter ofendido e sem qualquer motivo para o condenarem, tornou-se incómodo demais para os que se julgavam donos e senhores da verdade e do poder. Para se livrarem dele, os importantes, que eram inimigos entre si, fizeram as pazes e uniram-se contra ele. Promoveram o torpe compadrio, manipularam o povo, subornaram testemunhas falsas, subverteram os tribunais, condenaram Jesus à morte como blasfemo e agitador do povo, a morte mais vexatória do tempo. E pronto, ponto, pensava eles!

Mas o Pai manifestou a soberania de Jesus ressuscitando-o de entre os mortos e exaltando-o na sua glória. Ressuscitou, apresentou-se glorioso e foi o cabo dos trabalhos. Pôs tudo e todos em alegre alvoroço a fazer saltitar, de boca em boca, a célere notícia de que estava vivo, a notícia mais difícil de tragar por quem o levara à morte. Preocupados com o que ouviam, até inventaram teorias para desacreditar o facto, não queriam, não lhes convinha acreditar. Mas os discípulos de Jesus não desistiam, não podiam calar o que tinham visto e ouvido. Continuaram, com determinação e garra, esta profunda revolução social a partir do interior de cada um. Infelizmente com alguns desvios ao longo da história, é verdade, mas logo se refontalizando em fidelidade ao Senhor e à missão que lhe fora confiada. Com a força do Espírito, promoveram a cultura do amor fraterno, anunciaram o Evangelho. Apontaram princípios e valores que revolucionaram toda a comunidade humana em questão de Direitos e Deveres, fomentaram o discipulado universal.

Deus visitara o seu povo, uma visita de extraordinária importância e de presença permanente. Deus cumprira as promessas feitas a Abraão e à sua descendência. E fê-lo através do seu Filho muito amado, nascido da Virgem Maria pela ação do Espírito Santo e cujo nascimento começou por ser anunciado às periferias, aos pastores, como uma grande alegria para todo o povo: “nasceu-vos hoje, na cidade de David, um salvador que é Cristo, Senhor”. Não era mais uma notícia entre tantas outras, era a notícia por excelência perante a qual jamais alguém ficaria indiferente. O Filho eterno de Deus, fez-se carne e habitou entre nós, com uma identidade própria e uma missão singular. Deus amou tanto o mundo, que lhe entregou o seu próprio Filho, “para que toda a pessoa que acredite nele não pereça, mas tenha a vida eterna”. Sendo de condição divina, “não se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si próprio, assumindo a condição de servo, tornou-se semelhante aos homens”. O próprio nome ‘Jesus’ significa “Deus salva”, ele “salvará o seu povo dos seus pecados”, até porque não existe “debaixo do céu outro nome dado aos homens, pelo qual possamos ser salvos”. Ele é o único mediador entre Deus e os homens. O único Salvador, o Cristo, o ungido pelo Espírito Santo, o Messias prometido, a esperança de Israel, o Senhor, o Filho único do Pai, o Deus vivo que, sendo, por sua natureza, invisível, se tornou visível aos nossos olhos. Verdadeiro homem, tinha conhecimento humano adquirido pela educação e experiência devida, conhecimento limitado. Pela sua união com o Verbo, manifestava conhecimento íntimo e imediato de seu Pai, manifestava conhecer os pensamentos secretos do coração humano. Entre a sua vontade humana e divina não havia resistência nem oposição.

Se o Pai, aquando da transfiguração, nos mandou escutá-lo, ele apresentou-se como modelo das bem-aventuranças e a norma da nova Lei: “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”, “assim como eu fiz fazei vós também”, “tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim que sou manso e humilde de coração”, “eu sou o caminho, a verdade e a vida”, “ninguém vai ao Pai senão por mim”, “quem quiser ser meu discípulo peque na sua cruz e siga-me”.

Fazer acontecer é um dever dos seus discípulos! Como criaturas, amar o Criador que tanto nos amou é uma exigência da fé e um dever de gratidão. Refontalizar a vida em Cristo Jesus, tendo presente a encarnação, o presépio, a sua vida em família e pública, o que Ele disse e fez até à Cruz e Ressurreição, implica ter viva consciência de pertença à sua Igreja e caminhar juntos na comunidade cristã, com alegria e esperança, sendo testemunhas no seio da comunidade humana!

Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 10-12-2021.

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