E daí?… Daí, morreu!…

Não por tocar violino, claro. Também tocava piano.

De ascendência espanhola, nasceu na Nicarágua, chamava-se Maria Romero Meneses. Foi salesiana, acreditamos que seja nossa protetora, esse favor lho pedimos. Cresceu numa família numerosa e feliz. Estudou música, tocava piano e violino, gostava da pintura e do desenho, tinha aptidão para as artes. É certo que isto de associar os sons e as palavras, as cores e as formas, a criatividade e o engenho é só para alguns. Só toca viola quem tem unhas. Fazer da vida uma obra-prima, porém, isso sim, isso é tarefa de todos. Todos devemos arregaçar as mangas, deitar as mãos às rabiças do arado e olhar em frente, sem sair da linha, virando a leiva. Esta função aratória, este ato de lavrar o coração e a vida, pode encontrar terrenos secos e duros, terrenos fundos e húmidos, terrenos com ervanço e raizame densos que é preciso desbravar, passarinhos e passarões que se têm de espantar (cf. Lc 8, 4-15). Tudo será possível se feito com humildade e esperança, com sentimentos de gratidão para com quem no-lo permite e ajuda a fazer, com determinação e alegria da nossa parte.

Maria Romero teve a sua primeira grande escola no testemunho dos seus pais. Foi aí que cavou e construiu os alicerces para fazer as mais importante opções da sua vida. Os gestos concretos de seus pais, sobretudo para com os pobres, sempre a sensibilizavam e motivaram a rasgar caminhos, a descobrir valores e deveres, a não cruzar os braços, a buscar significado e sentido para a sua vida. Seu pai era ministro da República, sem peneiras. Aos doze anos, Maria Romero entrou no colégio das Filhas de Maria Auxiliadora. Sempre disponível e alegre, sentia que o carisma de São João Bosco tinha sido criado a pensar nela.

Um carisma é um dom, que Deus, através do Espírito Santo, concede a algumas pessoas, não para seu próprio proveito ou se colocarem em bicos de pés, mas para benefício dos outros, da comunidade. Quando a pessoa que recebeu um determinado carisma o coloca a render com humildade e paciência, essa pessoa encanta, cativa, arrasta, centraliza em Jesus, faz discípulos, transforma a história.

Na fidelidade ao carisma de São João Bosco, Maria Romero foi-se descobrindo cada vez mais na sua riqueza e pobreza à luz da Palavra de Deus e do referido carisma. No noviciado, ensina música, colabora, toma contacto com a pobreza juvenil, sente o dever de trabalhar com os jovens. O trabalho, adaptado à idade e circunstâncias da pessoa, é sempre um caminho de amadurecimento pessoal, faz parte do processo educativo, gera autonomia e liberdade, aguça a criatividade, desenvolve, realiza, responsabiliza no bem comum. Quando alguém toma opções estruturantes da vida sem nunca ter saltado do sofá, sem nunca ter, por comodismo ou por medo e calculismo, lutado pela sua autonomia, isso não augura nada de bom, tanto para essa pessoa como para com quem ela vai ter de viver, trabalhar ou conviver…

Feitos os votos perpétuos, Maria Romero foi enviada em missão para São José, na Costa Rica, a qual se tornou a sua segunda pátria. Destinada primeiramente a ensinar música, desenho e datilografia, incluiu nas suas atividades educativas a catequese aos jovens das periferias da capital. Mesmo trabalhando num colégio de jovens, ela procura, sobretudo, crianças pobres e abandonadas. De entre as suas melhores alunas, surgem aquelas que também se sentem tocadas pelo carisma que ela testemunhava. Com genica e ardor, logo se dedicam à obra de promoção social, partem em direção às preferias, curando e libertando, em fidelidade a Cristo presente nos pobres. Ajudam a limpar as barracas, levam comida e roupa, fazem catequese. Os oratórios festivos para os rapazes também logo acabam por surgir. À sua Rainha por excelência – Maria Auxiliadora -, Romero recorre e agradece os muitos benfeitores que iam suportando as obras sociais a que ia dando corpo. Graças ao voluntariado de médicos especialistas, consegue uma policlínica, com várias especialidades, assegurando a assistência médico-farmacêutica aos pobres, em cuja estrutura também podiam desenvolver a sua formação cultural e espiritual. Sempre sensível à promoção do pobre, iniciou uma série de cursos de qualificação profissional para jovens e adultos, capacitando-os quer para as atividades domésticas mais necessárias, como cozinha, costura e outros trabalhos, quer para outras áreas de trabalho, habilitando-os a tocar a vida para a frente de forma capaz e autónoma. Para as famílias sem teto, conseguiu um grande terreno onde coordenou a construção de casas. É a cidade de Santa Maria, uma obra que continua nos dias de hoje, graças a uma Associação de Leigos dedicados. Para difundir a devoção salesiana a Maria Auxiliadora, coordenou a construção de uma grandiosa igreja no centro da capital do país, uma obra construída pela força da fé e apoio de muitos benfeitores, envolvendo a própria comunidade. Contemplativa na ação e conselheira espiritual, dá início a uma série de exercícios espirituais destinados a benfeitores, jovens e adultos, pais e mães de família. Os seus escritos têm tido várias edições. Morreu vítima de ataque cardíaco, em 1977. O Governo da Costa Rica, declarou-a cidadã honorária da nação. São João Paulo II beatificou-a em 2002, celebra-se a 7 de julho, dia do seu falecimento. É cidadã do mundo!

Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 30-06-2023.

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