O desenvolvimento sustentável não se confunde com o progresso, é muito mais do que isso, acho. Se o progresso da ciência, da técnica, e de tudo o mais, não conduz ao desenvolvimento social, bolas para o progresso! Se o desenvolvimento pensa que pode dispensar o progresso, que sempre lhe rasga horizontes e caminhos sem fim, bolas para o desenvolvimento! Se a economia está a crescer mas não melhora a vida das pessoas, bolas para a economia! Se o lucro é tido como motor essencial de qualquer negócio ou empresa, mas cria ricos mais ricos e pobres mais pobres, bolas para o lucro! Se a concorrência é a lei suprema da economia mas sem qualquer espécie de obrigações sociais, bolas para a concorrência! Se há quem não goste desta minha generosa distribuição de bolas, sentindo-se discriminado, bolas para ele! Com tantas bolas, não se deveria chutar ao lado ou por cima da barra. No entanto, aconteça o golo ou não aconteça o golo, não falta quem diga: bolas para o árbitro! Como é evidente, os governos e as oposições não são uns meros apanha bolas destes jogadores. Se o fossem, bolas para eles! Se estou a ver mal, bolas para mim!

O desenvolvimento procura o crescimento sustentável e a sua expansão, tem os olhos no futuro, na qualidade e na quantidade, é abrangente, procura o bem comum, o bem-estar de todas as pessoas, de todo o país. Sem ir mais para trás no que a Igreja foi dizendo sobre a evolução social – aliás, um património de princípios e valores tão grande quão ignorado por preconceitos e desapreço -, em maio de 1961, João XXIII chamava a atenção para os desiguais desenvolvimentos e oportunidades dentro de cada país, para a desproporção existente entre território e população e introduzia novos conceitos como o bem comum, a socialização, a justa distribuição do produto social, etc…

Escrevia ele: “Não é raro que, entre cidadãos do mesmo país, haja desigualdades económicas e sociais pronunciadas. Isso deve-se principalmente a viverem e trabalharem uns em zonas economicamente desenvolvidas e outros em zonas atrasadas. A justiça e a equidade exigem que os poderes públicos se empenhem em eliminar ou diminuir essas desigualdades. Para isso, deve procurar-se que, nas zonas menos desenvolvidas, sejam garantidos os serviços públicos essenciais segundo as formas e os graus sugeridos ou reclamados pelo meio e correspondentes, em princípio, ao padrão de vida médio, vigente no país. Mas não se requer menos uma política económica e social adequada, principalmente quanto à oferta de trabalho, às migrações da população, aos salários, aos impostos, ao crédito, aos investimentos, atendendo de modo particular às indústrias de caráter propulsivo: política capaz de promover a absorção e o emprego remunerador da mão-de-obra, de estimular o espírito empreendedor e de aproveitar os recursos locais”.

Defendia que a ação dos poderes públicos em prol do bem comum se devia exercer num plano de conjunto para todo o país, com a preocupação constante de contribuir para o progresso gradual, simultâneo e proporcionado da agricultura, da indústria e dos serviços, procurando que os cidadãos das zonas menos desenvolvidas se sentissem e fossem, na medida do possível, os responsáveis e os realizadores do crescimento económico. Lembrava que por força do princípio de subsidiariedade, o poder deveria favorecer e ajudar a iniciativa privada, confiando-lhe a continuação do desenvolvimento económico (cf. MM149-151).

Quanto à saída das populações para os meios urbanos, dizia João XXIII: “é incontestável que se dá um êxodo das populações rurais em direção aos centros urbanos. É um facto que se verifica em quase todos os países e algumas vezes atinge proporções enormes e cria problemas humanos complexos, difíceis de resolver. Sabemos que, à medida que uma economia progride, diminui a mão de obra empregada na agricultura, aumenta a percentagem dos que trabalham na indústria e nos vários serviços. Pensamos, contudo, que o êxodo da população, do setor agrícola para outros setores produtivos, não é provocado somente pelo progresso económico. Deve-se a múltiplas outras razões, como a vontade de fugir de um ambiente considerado fechado e sem futuro; à sede de novidades e aventuras, que domina a geração presente; à esperança de enriquecimento rápido; à miragem de uma vida mais livre, com os meios e facilidades que oferecem os aglomerados urbanos. Mas julgamos que não se pode duvidar de que este êxodo é também provocado pelo fato de ser o setor agrícola, quase em toda a parte, um setor deprimido, tanto no que diz respeito ao índice de produtividade da mão-de-obra, como pelo que se refere ao nível de vida das populações rurais. Daí um problema de fundo, que se apresenta a quase todos os Estados: como reduzir o desequilíbrio da produtividade entre o setor agrícola, por um lado, e o setor industrial e os vários serviços, pelo outro? Isto, para o nível de vida da população rural se distanciar o menos possível do nível de vida dos que trabalham na indústria e nos serviços; para os agricultores não sofrerem um complexo de inferioridade, antes, pelo contrário, se persuadirem de que, também no meio rural, podem afirmar e aperfeiçoar a sua personalidade pelo trabalho, e olhar confiados para o futuro (Id. 123-124).

Que bom seria se as pessoas pudessem encontrar no trabalho da terra, com o seu progresso e desenvolvimento, um estímulo para se afirmarem, se realizarem, se enriquecerem material e espiritualmente, concebendo-o como uma vocação ao serviço do plano de Deus através da História e em prol do bem comum!

Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 26-05-2023.

 

 

 

 

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