Entre tantos festivais que por aqui, ali e acolá se vão realizando, e bem, vai acontecer, de 1 a 4 de setembro, mais uma chamada de atenção para aqueloutro de inigualável grandiosidade e qualidade. É um Festival Sinfónico, digamos assim. É permanente e tem inspirado génios e menos génios! Sendo global, cada pessoa de boa vontade, onde quer que esteja e sem pagar entrada, dele pode usufruir e associar-se à sua divulgação, defesa e promoção, ajudando a corrigir as dissonâncias gananciosamente introduzidas e a travar as fífias de quem, não querendo afinar pelo mesmo lamiré, se julga mais competente que o seu compositor e maestro, dispensando-o. A partitura, os acidentes e andamentos musicais, as melodias em variedade imensa de sons e ritmos, as vozes, os instrumentos e instrumentistas das notáveis orquestras em palco estão a ser manipuladas e corrompidas. Muitos dos seus regentes, espalhafatosos e desgrenhados tanto quanto baste a fazer captar o olhar de todos, usam fraca e truculenta batuta, ignorando os avisos da mais alta ciência na matéria em causa. Ou se fazem moucos ou moucaram mesmo, lá diz a mariquinhas! Não há prótese que se lhes ajuste nem desafinação que os demova da sua performance sem verdade interpretativa! A crise climática, a redução da biodiversidade, as crises sanitárias e os conflitos bélicos são prova dessa triste ingerência a reclamar conversão urgente e diária, de todos, não é opcional ou só para os outros. Esta conversão tem de ser individual e familiar; de instituições, comunidades e Estados; de empresas de produção, exploração e lazer; de mercados e consumo; de estilos de vida e duma organização social apoiada mais nas exigências da justiça e do desenvolvimento sustentável do que nas da irresponsabilidade, da indiferença e do desperdício. É uma exigência da vocação de todos a guardiães desta Casa Comum, diz quem sabe e alerta. Se assim não for, as consequências deste deixa-correr serão cada vez mais graves e sofridas. A comunhão universal grita por uma relação diferente de uns com os outros e de todos com a Criação. Mais: usufruir desta imensa e belíssima catedral que é a natureza, dever-nos-á fazer sentir a obrigação de nos associarmos ao seu “grandioso coro cósmico”, e, afinando pelo mesmo diapasão, entoarmos hinos de ação de graças por tanta beleza sem igual.

Instituído pelo Papa Francisco em agosto de 2015, todos os anos, a 1 de setembro, data em que já era comemorado pela Igreja Ortodoxa, vamos celebrar o Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação, um tempo que terminará a 4 de outubro com a festa de São Francisco de Assis, rezando com ele: «louvado sejas, meu Senhor, com todas as tuas criaturas». O Santo Padre, na sua Mensagem para este Dia Mundial, convida-nos a escutar a voz da criação, “um canto doce que louva o nosso amado Criador”, mesmo que acompanhado por um coro de gritos dissonantes e amargos a lamentarem-se dos maus-tratos.

Como refere o Papa, esses gritos amargos surgem de vários cantos e origens: “Primeiro, é a irmã Madre Terra que grita. À mercê dos nossos excessos consumistas, geme implorando para pararmos com os nossos abusos e a sua destruição. Depois gritam as diversas criaturas. À mercê dum «antropocentrismo despótico», nos antípodas da centralidade de Cristo na obra da criação, estão a extinguir-se inúmeras espécies, cessando para sempre os seus hinos de louvor a Deus. Mas gritam também os mais pobres entre nós. Expostos à crise climática, sofrem mais severamente o impacto de secas, inundações, furacões e vagas de calor que se vão tornando cada vez mais intensas e frequentes. E gritam ainda os nossos irmãos e irmãs de povos indígenas. Por causa de predatórios interesses económicos, os seus territórios ancestrais são invadidos e devastados por todo o lado, lançando «um clamor que brada ao céu». Enfim gritam os nossos filhos. Ameaçados por um egoísmo míope, os adolescentes pedem-nos ansiosamente, a nós adultos, que façamos todo o possível para prevenir ou pelo menos limitar o colapso dos ecossistemas do nosso planeta. Escutando estes gritos amargos, devemo-nos arrepender e mudar os estilos de vida e os sistemas danosos”.

Em novembro de 2022, no Egito, vai realizar-se a cimeira COP27 sobre o clima, mais uma oportunidade para promover uma eficaz implementação do Acordo de Paris, limitando o aumento da temperatura a 1,5°C, objetivo que “é bastante árduo e requer uma colaboração responsável entre todas as nações para apresentar planos climáticos ou Contribuições Determinadas a nível nacional mais ambiciosos, para reduzir a zero, com a maior urgência possível, as emissões globais dos gases de efeito estufa”.

Em dezembro próximo também terá lugar a cimeira COP15 sobre a biodiversidade. Será no Canadá e “proporcionará à boa vontade dos Governos uma oportunidade importante para adotarem um novo acordo multilateral para deter a destruição dos ecossistemas e a extinção das espécies”. O Papa Francisco, na referida Mensagem que, aliás, convido a ler, pede que rezemos e convidemos as nações a porem-se de acordo sobre alguns princípios-chave que ele refere e acha se deveriam ter em conta; reitera às grandes empresas mineiras, petrolíferas, florestais, imobiliárias e agroalimentares, “que deixem de destruir florestas, zonas húmidas e montanhas, que deixem de poluir rios e mares, que deixem de intoxicar as pessoas e os alimentos»; solicita às nações que mais têm contribuído para uma maior poluição que paguem essa “dívida ecológica”, realizando “passos mais ambiciosos tanto na COP27 como na COP15” e cumpram “as suas promessas de apoio financeiro e técnico às nações economicamente mais pobres, que já sofrem o peso maior da crise climática”.

Antonino Dias

Portalegre-Castelo Branco, 26-08-2022.

 

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