Celebrámos, em 1 de julho, desde 1979, o Dia Mundial do Salvamento. Por sua vez, as Nações Unidas, em 2021, declararam o dia 25 de julho como o Dia Mundial da Prevenção do Afogamento. Num relatório da OMS, consta que durante a última década, o afogamento causou mais de 2,5 milhões de mortes. Mais de 90% nos países mais pobres: em rios, lagos, poços, reservatórios de água e piscinas. A maior parte das vítimas são crianças entre os 1 e 14 anos. Em 2019, mais de 235 mil pessoas morreram desta forma, o que equivale a 650 mortes por dia, 26 óbitos por hora.
Destes salvamentos de situações indesejáveis, situações de perigo, em que algumas pessoas, por vezes, se encontram, passamos à Salvação, da qual, não apenas algumas pessoas, mas toda a humanidade precisa e pela qual anseia como peregrina da esperança. É certo que não há estatísticas que nos possam esclarecer sobre o número dos náufragos desta vida terrena. Não há ciência nem fonte fidedigna que nos esclareça. Ninguém do outro lado da vida nos veio informar. O que se presume, isso sim, é que haverá muitas surpresas nessa hora da verdade. E porquê? Porque o Salvador, aquele que nos salva das águas turbas e sufocantes deste vale de lágrimas, usa uma lógica de ver, avaliar e julgar, infinitamente distinta da tantas vezes mesquinha, míope e vesga lógica humana. A lógica dele confunde os sábios e os poderosos, os que se têm a si próprios como pessoas de bem e reivindicam direitos diante dele, ama quem é desprezado, traz para a frente da fila quem é colocado no fim, chama bem-aventurados aos desafortunados, aos humildes e pobres, aos que sofrem a injustiça e a exclusão, aos que choram e são perseguidos por amor da justiça. Ele vê e lê a verdade no coração de cada um, rejeita o fingimento, o querer aparentar. Apresentando-se como o único Salvador, pagou um alto preço por isso. Não conhecendo pecado, tornou-se vítima expiatória, fez-se pecado por todos para que nele todos fossem feitos justiça de Deus. Este seu gesto de amor para com todos, foi incómodo demais para alguns e mataram-no do modo mais ignóbil e vergonhoso. Mas ele venceu, perdoou, ressuscitou, não guardou ressentimentos, está vivo, caminha connosco e não há outro nome pelo qual possamos ser salvos. Veio para ser a luz do mundo e atrair todos a si, desejando que todos quantos acreditem nele não morram, mas tenham a vida eterna, conheçam a verdade. Crer nele, renascer pela água e pelo Espírito, ser alimentado pela Eucaristia, cumprir os mandamentos, converter-se, carregar a cruz de cada dia, segui-lo, amar como ele nos amou, vigiar e orar, são as pranchas, as boias e os kits da salvação que ele colocou ao dispor de todos, gratuitamente, sem apresentar fatura. Pediu para se ir aperfeiçoando as técnicas do seu uso e se colaborasse com prudência, humildade e boas práticas, sem entrar em pânico, sem ter medo, apenas confiando. Após a desobediência dos nossos ancestrais, o protagonista da salvação, de facto, é o próprio Deus, que, fiel à sua promessa, a cumpriu por meio dos méritos, da misericórdia e da graça de Jesus, o único e verdadeiro salvador. Após isso, Jesus enviou os seus discípulos por todas as nações. E eles foram, com alegria e esperança, a anunciar o que viram, ouviram e contemplaram, apelando à conversão e influenciando as realidades temporais como a política e a economia, o trabalho e a sociedade, a técnica e a comunicação, a comunidade internacional e as relações entre culturas e povos. É certo que se quer fazer crer que a sorte de cada um e do próprio mundo não passa por aí. Mas, sendo Deus a infinita bondade e misericórdia, como entender o ter enviado o seu Filho até nós, para ser morto, e morto dessa forma, se a salvação não fosse, de facto, uma questão importante? Seria inexplicável, sem sentido, não seria um ato de amor, muito menos de amor de Pai.
No entanto, se a salvação é e está disponível para todos, pode acontecer que nem todos estejam interiormente disponíveis e abertos à palavra e à pessoa de Jesus. Sem dúvida que há aqui um movimento de duas vontades e liberdades. As de Deus, que chama e se faz encontrado, sem se impor nem forçar, propondo-se, apenas e só. E as de quem é chamado, que responde, positiva ou negativamente. Ora, sendo verdade que Jesus veio para salvar a todos e não há outro nome pelo qual possamos ser salvos, há, por certo, outros caminhos além dos da Igreja que conduzem a Cristo. Se repararmos, Jesus, por vezes, denunciou a pouca fé dos discípulos e elogiou, por exemplo, a fé dum centurião romano e duma mulher sirofenícia, ambos pagãos, uns fora do sistema. Afirmou que nem todos os que invocam o Senhor entrarão no reino dos céus, mas sim aqueles que fazem a vontade do Pai que está nos céus. Embora nem sempre o digamos assim, não é a fé que nos salva, quem nos salva é Jesus, embora seja por meio da fé que entramos em relação com ele. Todavia, se quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele, o amor é maior que a fé e maior que a esperança. Torna possível fazer o que é justo e verdadeiro, ter gestos de autêntico amor. A origem deste procedimento está em Deus, que, pela ação do seu Espírito, sempre nos indica os caminhos do amor, do bem, da salvação, do Reino. Há quem procure a salvação por outros caminhos, noutra religião, por exemplo. Mesmo que não sejam todas iguais, se aí busca a verdade, segue a sua consciência, faz o bem e fomenta a paz, está a viver valores do Reino, pois o bem e a verdade vem do Espírito Santo, vem de Deus. E quem não está contra nós é a nosso favor. Desde sempre que se realça, em vários documentos da Igreja, que cada cultura, cada pessoa, cada religião, trazem em si ‘Sementes do Verbo’, sementes da verdade, sementes que Deus tem revelado ao longo da história, culminando em Cristo que é a própria verdade, sementes que podem germinar, frutificar, amadurecer e chegar à plenitude, em Cristo. Será na verdade, que é Cristo, o Filho de Deus, que todos nos haveremos de encontrar, pois Deus, que muitas vezes e de muitos modos falou aos nossos pais pelos profetas, nestes tempos que são os últimos, falou-nos por meio de seu Filho, como nos diz a Escritura, não havendo outro pelo qual sejamos salvos.
Antonino Dias
Portalegre-Castelo Branco, 04-07-2025.